Friday, January 05, 2007

Era amor...

Encontrava-se descalça na praia, a areia por entre os dedos frios de Inverno. De vez em quando fazia aquele sorriso de quem se lembra de algo doce; de vez em quando auto-abraçava-se como que a proteger-se do frio, ou do resto, ou... indiferente. Meditava sobre as coisas simples e felizes, aquelas das quais falam poemas, textos, reflexões, ... Fugir da água quando se aproximava demais, o ondular da maré, sensações, cócegas, aninhanços, palavras, bilhetes sorrateiros, sorrisos desconfiados, fotografias (aquele momento imperfeito da pausa, como se o Mundo inteiro parasse para se auto-retratar), rituais de aconchego perfeito, riscas laranja no horizonte, nuvens cor de rosa, o corar insimulável, ... Começou a acelerar o passo, uns segundos mais tarde corria, descalça, já na estrada, o alcatrão sujo que nem sentia queimar-lhe os pés, corria... Só parou quando chegou à sua porta. Sentiu a sua palpitação descontrolada, ajeitou o vestido e mesmo assim, despenteada e de sapatos na mão bateu-lhe à porta. Ele abriu; e não parecia nada surpreendido. Tinha-a sentido, mesmo do outro lado da madeira da porta. Não houve uma única palavra. O silêncio doía, corroía o tempo. E sem uma palavra, com um mero olhar de desespero partilhado, sucumbiram ao reprimido mas permitido desejo. Permitido por eles, em cada passo distante. A repressão sempre tinha vindo de fora, de um mundo selvaticamente recolhido em si só. E entregaram-se em plena comunhão e mudez. No fim (aquele princípio inflamado), ainda em silêncio profundo, choraram. Unos mas sozinhos. Olharam-se. Pela primeira vez há muito tempo, voltaram a olhar-se e todas as justificações, os argumentos se dissiparam com o calor do quarto. Bastou um sorriso. Parcas palavras, um beijo demorado. Para não estragar o momento com frases desnecessárias alheias à previsão do futuro perfeito, deixá-las para outro dia, imprimindo nos gestos o sentimento que lhe tinha percorrido o corpo, saiu. Voltou a cabeça para trás antes de sair do quarto. Ele não a olhava, contemplava-a. Foi aí que ela riu, o coração a sair-lhe pelas gargalhadas, aquelas felizes, as verdadeiras. Fez aquele pequeno aceno com o nariz. Gatos. Saiu.
Já a caminho de casa, dentro do carro, não via a estrada à sua frente. Apenas ria, simplesmente. E sentiu algo forte, como uma dor, mas boa. Apertou o peito para tentar vislumbrar o que era. Primeiro não percebeu mas só depois verbalizou para si própria. Era amor.

3 comments:

Sara said...

insubstituível =)*s

Sara said...

insubstituível =)*

Unknown said...

Se a descrição fosse feita ao inverso, se os sentimentos se cruzassem e passassem de uns para os outros a descrição estaria correctsa na mesma, seria o Amor que falas e que ao definires te perdes na definição porque simplesmente não a tem, e se trasforma em algo que agarramos no peito e não sabemos o que é nem o que podia vir a ser...
E depois aquele estado estuporoso em que ficamos quando estamos apaixonados nada tem a ver com o colorido do Amor... Poruqe o Amor é nobre e deixa marca e a Paixão destaca-se de nós quando menos esperamos...