Sunday, January 14, 2007

Poder?!

Olhava para o lado de lá da janela enquanto ele falava... Um monólogo, ele seria o único a decifrar as suas próprias palavras. Decidi sair e virar-lhe as costas, mesmo sentindo-me impotente perante uma ruptura, mesmo sentindo que ninguém tem o poder suficiente para ser feliz e, no caso específico do amor, não há feminismos, machismos ou que tais que se sobreponham ao ideal de felicidade. Saí para a rua, pés na estrada. A rua repleta de seres desinteressantes por si só, almas abandonadas ao dia. Ouvi-a palestrar sobre mulheres. As mulheres. A sua relevância na música e na vida. Chicks on speed, ouviam intercaladamente, girls monster... Algumas, a nata do pós-punk... outras dispensáveis, acrescentei num sussuro. As mulheres e os homens não são nada perante o fruto do disperso sentimento. Vi-o sair também; Olhar para mim, dar aquela sensação de que não me queria deixar partir. Virei-lhe as costas e caminhei na direcção do sol. Sem rumos, sem rumo... Palavras eclodiam enquanto momentos se espalhavam pelo rastejar do meu cérebro e enquanto ele gritava o nosso poema, o nosso Jorge Amado, "Também de meu amor precisas para ser feliz, desse amor de impurezas, errado e torto, devasso e ardente, que te faz sofrer." Enfureci-me e cerrei os punhos. Mas não me virei. Parei para me conseguir concentrar no peso da minha fúria e na subtileza da sua razão. Segui.
Anos depois, após a minha luta desenfreada pelo conhecimento dos caminhos do mundo, encontrava-me na mesma rua, no mesmo local onde podia até sentir o calor onde deixei a minha raiva. Pensei no histerismo e graça dos jovens a que se refere Mafalda Ivo Cruz, uma projecção de nós próprios. E ali estava eu, projectada no desconhecimento de mim própria e do suor do mundo, enfurecido pelos brindes não feitos, pelas garrafas de Bordeaux não bebidas, pelos mundos não girados, pelos amores contornados... Ali estava eu entre almas na certeza de que o mundo tem as nossas casas, lacunas inegáveis, mas locais onde voltar é o mais perfeito e singelo reencontro.

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