Há dias em que captamos a realidade, em que a colocamos no ponto de saturação em que podemos dissecá-la e completá-la e entendê-la. Não nos colocamos em nenhum ponto de onde devamos seguir um caminho ou outro ou onde devamos sequer seguir uma coisa qualquer. Auto-colocamo-nos, somente, na compreensão de nós próprios. Bem, o que importa, verdadeiramente, é que o mundo nos pareça aquele lugar onde pertencemos, de onde corremos ao futuro, de onde as expectativas se completam. E, como te disse, decidi que o que é vital é que consiga sempre perceber onde estão as coisas importantes e defendê-las acima de tudo. Defender com trabalho o meu trabalho, defender com amizade as minhas amizades, defender com vida a minha vida. Tudo o resto é a paisagem do dia, pela qual lutamos com mais ou menos força, com mais ou menos convicção, na sabedoria efectiva de que há meios, tantos meios, para perseguirmos o que nos torna nós, quem nos torna nós, quem nos mantém. Se todos compreendessem isso, a atmosfera poderia, por um dia, who knows, cheirar a paz.
Monday, September 28, 2009
Wednesday, September 23, 2009
'Eu não sirvo de exemplo para nada, mas, se você quer saber se isso é possível, me ofereço como piloto de testes. Sou a Miss Imperfeita, muito prazer. A imperfeita que faz tudo o que precisa fazer, como boa profissional, mãe, filha e mulher que também sou: trabalho todos os dias, ganho minha grana, vou ao supermercado, decido o cardápio das refeições, cuido dos filhos, marido (se tiver), telefono sempre para minha mãe, procuro minhas amigas, namoro, viajo, vou ao cinema, pago minhas contas, respondo a toneladas de e mails, faço revisões no dentista, mamografia, caminho meia hora diariamente, compro flores para casa, providencio os consertos domésticos e ainda faço as unhas e depilação!
E, entre uma coisa e outra, leio livros.
Portanto, sou ocupada, mas não uma workholic.
Por mais disciplinada e responsável que eu seja, aprendi duas coisinhas que operam milagres.
Primeiro: a dizer NÃO.
Segundo: a não sentir um pingo de culpa por dizer NÃO. Culpa por nada, aliás.
Existe a Coca Zero, o Fome Zero, o Recruta Zero. Pois inclua na sua lista a Culpa Zero.
Quando você nasceu, nenhum profeta adentrou a sala da maternidade e lhe apontou o dedo dizendo que a partir daquele momento você seria modelo para os outros. Seu pai e sua mãe, acredite, não tiveram essa expectativa: tudo o que desejaram é que você não chorasse muito durante as madrugadas e mamasse direitinho.
Você não é Nossa Senhora.
Você é, humildemente, uma mulher.
E, se não aprender a delegar, a priorizar e a se divertir, bye-bye vida interessante. Porque vida interessante não é ter a agenda lotada, não é ser sempre politicamente correta, não é topar qualquer projeto por dinheiro, não é atender a todos e criar para si a falsa impressão de ser indispensável. É ter tempo.
Tempo para fazer nada.
Tempo para fazer tudo.
Tempo para dançar sozinha na sala.
Tempo para bisbilhotar uma loja de discos.
Tempo para sumir dois dias com seu amor.
Três dias.
Cinco dias!
Tempo para uma massagem.
Tempo para ver a novela.
Tempo para receber aquela sua amiga que é consultora de produtos de beleza.
Tempo para fazer um trabalho voluntário.
Tempo para procurar um abajur novo para seu quarto.
Tempo para conhecer outras pessoas.
Voltar a estudar.
Para engravidar.
Tempo para escrever um livro que você nem sabe se um dia será editado.
Tempo, principalmente, para descobrir que você pode ser perfeitamente organizada e profissional sem deixar de existir. Porque nossa existência não é contabilizada por um relógio de ponto ou pela quantidade de memorandos virtuais que atolam nossa caixa postal.
Existir, a que será que se destina?
Destina-se a ter o tempo a favor, e não contra.
A mulher moderna anda muito antiga. Acredita que, se não for super, se não for mega, se não for uma executiva ISO 9000, não será bem avaliada. Está tentando provar não-sei-o-quê para não-sei-quem. Precisa respeitar o mosaico de si mesma, privilegiar cada pedacinho de si. Se o trabalho é um pedação de sua vida, ótimo! Nada é mais elegante, charmoso e inteligente do que ser independente. Mulher que se sustenta fica muito mais sexy e muito mais livre para ir e vir. Desde que lembre de separar alguns bons momentos da semana para usufruir essa independência, senão é escravidão, a mesma que nos mantinha trancafiadas em casa, espiando a vida pela janela.
Desacelerar tem um custo. Talvez seja preciso esquecer a bolsa Prada, o hotel decorado pelo Philippe Starck e o batom da M.A.C. Mas, se você precisa vender a alma ao diabo para ter tudo isso, francamente, está precisando rever seus valores.
E descobrir que uma bolsa de palha, uma pousadinha rústica à beira-mar e o rosto lavado (ok, esqueça o rosto lavado) podem ser prazeres cinco estrelas e nos dar uma nova perspectiva sobre o que é, afinal, uma vida interessante'
Martha Medeiros - Jornalista e escritora
[Obrigada J., acho que tocaste no ponto...]
Monday, September 21, 2009
Vida
Quero beber um café contigo. Sentar-me no canto, afagar o jornal. Quero beber um café contigo. E contigo, e contigo e contigo. Quero sugar o sabor a vida e a mar. Descobrir a verdadeira essência de ser descoberto. Avassalar os lábios e empenhar gargalhadas. Brinca com o meu estômago, alimenta as borboletas. O mundo está aí, eu estou aí. E tu, onde estás?
Thursday, September 17, 2009
Dissabor
Não sei. Quem és tu para me obrigar a saber, a ser, a querer ou todo outro verbo que implique uma acção. Quem és tu, no fundo, tantas e tantas vezes te perguntam e o teu preguiçoso eu pergunta ao tu se foste ou vens para ser, devagarinho e sem que ninguém descubra, de há um tempo para cá ou de todo o tempo para cá - uma formiga pequena que engana bem. Não me obrigues a amar-te ou a não querer-te, eu é que decido, ou não decido, decide ele ou "ele", que eu não sei de nada, não!: eu sei, sei que TU não sabes de nada. Não é raiva, quero (eu decido que quero!) encontrar-me contigo naquela esquina e sorrir um café, até ao dia do depois em que tu me encharcas de verbos e eu tenho de nadar para fora desse riacho, um riacho!, que tu criaste. Que dissabor, eu disse, quando o doce amargo canto me encaixou naquele canto.
É. E depois, em momentos, pode mudar. Às vezes, e, principalmente, quando tu não decides o que eu quero, eu só queria que tu me dissesses qual é o meu trilho e eu seguiria por aí. Nem penses. Pensar custa.
Friday, September 11, 2009
O primeiro dia do resto da tua vida.
Parei aqui. Só porque sim, porque havia tempo. E tempo, mesmo em desperdício, embala a sôfrega vontade de ver mais. Mesmo que te digam "não há mais" - pena. O que quer que seja: papel, paixão, carinho, vontade, tesão, uma casa ou uma sopa quente. Todo o doce - não haver mais dá pena. Sento-me numa sala que não é minha, cheia de palavras coladas às paredes, uma estória de uma história que ninguém me contou mas eu reinvento, com mais cavaleiros e aventura, talvez. Ser neste espaço tem o que se lhe diga. Vejo-te ali, encostado a uma parede, naquela posição, eu na outra, o outro na outra, todos equilibrados em pé, de braços cruzados, encaixotados neste mundo de trabalho que abraçámos sem força. Porque a tarefa, essa sim, abraçámo-la com tanta força... agora este mundo, este mundo e este espaço, quando pensado, é só uma luz ténue do que criámos, imaginando, para nós, para aquilo que é a nossa idílica mensagem de não-rotina. E chego à conclusão, porque tive tempo, que acabei de chegar a este mundo. E bem vinda. Bem vinda ao mundo real.
Tuesday, September 08, 2009
O homem que eu amo
O homem que eu amo
veio de tanto eu pedir
mas quando parei de esperá-lo
veio quando eu ao depená-lo
do meu sonho receio,
permiti que em vez de início ou fim
ele no meio de mim
fosse só o meio.
Não meio no sentido tático
de jeito ou de modo.
Meio no sentido de durante
de enquanto
de presente.
Quando abandonei o título futuro
definitivo da eternidade
o rótulo azarento de garantia
no departamento de intimidade,
quando abandonei o desejo
de ressarcir aquilo que perdi na antiguidade,
meu homem chegou cheio de saudade
ocupando inteiro
seu lugar de meio
sua inteira metade.
- Elisa Lucinda -
veio de tanto eu pedir
mas quando parei de esperá-lo
veio quando eu ao depená-lo
do meu sonho receio,
permiti que em vez de início ou fim
ele no meio de mim
fosse só o meio.
Não meio no sentido tático
de jeito ou de modo.
Meio no sentido de durante
de enquanto
de presente.
Quando abandonei o título futuro
definitivo da eternidade
o rótulo azarento de garantia
no departamento de intimidade,
quando abandonei o desejo
de ressarcir aquilo que perdi na antiguidade,
meu homem chegou cheio de saudade
ocupando inteiro
seu lugar de meio
sua inteira metade.
- Elisa Lucinda -
Thursday, September 03, 2009
Porque apetece dizer.
Ensinaste-me muito do que eu sei. Ensinaste-me o caminho da felicidade e da força, do encanto de existir nas mais pequenas coisas, porque hoje é hoje ou porque sim. Ensinaste-me a proporção dos 360/5. Ensinaste-me a rir, a valorizar e a desvalorizar, a entender o espaço. Ensinaste-me a ser-ser, a beber uma cápsula qualquer, a dormir no sofá à tarde, a olhar-me ao espelho quando eu mal conseguia. Ensinaste-me que as pessoas podem aceitar coisas erradas de uma forma serena, sem comprometerem os seus princípios. Ensinaste-me que podemos perdoar que não nos torna mais fracos. Ensinaste-me o que significa uma braseira e o que significa uma lágrima fácil. Ensinaste-me que as melhores pessoas não conseguem mentir às "suas" melhores pessoas. Ensinaste-me que fui dotada daquela sorte. Ensinaste-me que posso ser uma "mulher maravilhosa" mesmo quando estou sozinha porque nunca estou sozinha. Ensinaste-me a ser adepta dos dias maus. Ensinaste-me a não querer ver o futuro.
E quando me olho agora, por completo, e compreendo o alcance do que, dia a dia, conseguiste efectivamente transformar, só tenho vontade de um abraço e de um gelado de café naquela tigela. Obrigada.
[Espero ter conseguido, pelo menos, que interiorizasses a metáfora da Heidi!]
Wednesday, September 02, 2009
Dias.
Há dias em que basta um toque, um insorriso, para o teu baralho se desmoronar. E só temos força para o montar de novo no dia seguinte. E hoje foi assim.
[Senti-me errada. Não quero assim.]
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